terça-feira, 4 de setembro de 2007

O momento atual do futebol nacional

Mais de cinco mil jogadores brasileiros estão atuando hoje fora do país. Só no ano passado, oitocentos e cinqüenta e um jogadores trocaram os campos brasileiros para tentar a vida no exterior.

É essa uma infeliz realidade que não ocorre apenas na esfera do futebol. Cada vez mais os brasileiros buscam em outros países melhores condições de vida, com garantias que aqui, não encontramos uma vez que nossa permissiva e apática sociedade não se digna a lutar.

Analisando puramente a questão futebolística, ao dividirmos o número de jogadores atuando fora do país (5000) pelo número médio de atletas que compõe um elenco (30); temos que cento e sessenta e seis times compostos por trinta jogadores brasileiros atuam fora. A primeira divisão nacional é disputada por vinte agremiações, logo, temos mais de OITO DIVISÕES completas de jogadores brasileiros atuando fora do Brasil.

A verdade acima tem conseqüências diretas. Os jogadores brasileiros cada vez mais cedo saem do país para clubes não apenas europeus, mas do oriente, América do Norte e Central, países árabes e até da África.

Jogadores “não-prontos”, sem o devido polimento, deixam seu país para ir atrás do sonho de ganhar a vida jogando futebol. A grande maioria, infelizmente, não vai para times que contam com estrutura para que melhor desenvolvam seu potencial. Em muitos desses centros as condições de treinamento são tão precárias como aqui e muitas vezes os atletas são orientados por profissionais sem qualidade, sem conhecimento. Essa “soma de fatores” condena algumas carreiras à mediocridade.

Além do reflexo na carreira desses jogadores, existem outros, facilmente constatados no dia-a-dia dos times de futebol.

Estamos testemunhando campeonatos onde o nível é cada vez mais baixo. Para que se constate tal fato, não se precisa ser treinador, basta acompanhar, com certa proximidade, o cotidiano de alguma agremiação. Os jogadores cada vez mais são despreparados; muitos deles, sequer dominam os fundamentos necessários às posições onde imaginam jogar, reflexo da forma como se “produzem” os novos jogadores.

Antigamente as agremiações tinham verdadeiras equipes que nela trabalhavam por anos. Antes os clubes eram “escolas”, alguns times eram conhecidos pelo seu “toque de bola”, outros, pela “noção defensiva”; atualmente, os jogadores não têm tempo de “colarem grau” e são precocemente vendidos. Quem determina hoje a “forma de jogo” de um time são os empresários.

O empresário é um profissional como todo outro; no entanto, muitas vezes é visto, injustamente, como o “vilão” da atual situação, face infelizes exemplos de alguns expoentes do meio que, mais preocupados com o ganho imediato, olvidam-se de que a contraprestação dos seus serviços enseja o acompanhamento do atleta, o compromisso no desenvolvimento físico, tático, técnico, pessoal e familiar do seu CLIENTE.

A errada concepção de alguns maus profissionais leva à que alguns pensem que o atleta é apenas um bem, um objeto de troca e não o CLIENTE do empresário.

Nem estamos aqui ainda questionando os maus dirigentes, quem, utilizando-se de agremiações como se suas fossem, mascaram relações laborais e transações financeiras, obtendo ganhos indevidos, e, em não atuando corretamente, comprometem as temporadas dos clubes que administram para outros, não para si.

O fato é que hoje, jogadores de oitava categoria (pela conta acima demonstrada) vestem camisas de clubes tradicionais; muitas vezes são jovens despreparados que recebem a responsabilidade de serem craques sem ainda terem se tornado jogadores profissionais ou simplesmente homens.

Mas o torcedor não se preocupa com isso; e critica garotos que, bem trabalhados, poderiam ter algum futuro.

Mas, quem hoje, a não ser investidores, investem nesses talentos? Como “investir”, deve ser entendido o ato de formar, de preparar, educar o jogador, dentro e fora do campo e não apenas, demonstrar como atuar para que o “DVD” fique convincente.

Os clubes hoje, sucateados, apenas administram “escolinhas”, optando por produtos de vitrine. Com isso, torna-se muito mais interessante optar por expor na vitrine produtos “semi-acabados” a formar, com os devidos encargos e responsabilidades, novos talentos.

O pior dessa triste realidade é que hoje, um empresário coerente, um verdadeiro profissional, não consegue competir em igualdade de condições com aqueles que oferecem outras facilidades; o mesmo ocorre com os dirigentes coerentes que investem nas categorias de base, que, pelos custos e obrigações laborais decorrentes; são tolhidos de melhor atuar.

Os reflexos das considerações acima são claros. Hoje, atuam, no país, jogadores de menor qualidade que outrora e, cada vez mais o poder econômico se faz presente, sendo um diferencial no futebol profissional.

Para comprovar a primeira consideração, pergunto: “qual seria a seleção do campeonato nacional?”

Nela teríamos alguns jogadores estrangeiros, isso, por si só, já demonstra alguns dos pontos questionados; no entanto, vamos limitar a pergunta apenas aos jogadores brasileiros que aqui atuam.

A seleção de uns contará com uma série de veteranos, alguns retornados de fora do país, outros terão dificuldade para definir jogadores em algumas posições; no entanto, alguns nomes de jogadores que estão constantemente em “idas-e-voltas” para fora ou mesmo no país, serão mencionados.

Temos, logo, no país, uma “seleção de párias”.

O outro aspecto pode muito bem ser comprovado pelo líder do campeonato. O São Paulo montou seu elenco com jogadores relativamente rodados e, mesmo tendo hoje boa vantagem em pontuação frente aos demais, não convence como time inesquecível de futebol.

Vivemos hoje um campeonato onde determinados times têm, relativamente, um elenco superior aos demais, não importando essa afirmação, em que, efetivamente seja esse um esquadrão.

Ou o elenco do São Paulo atual pode ser comparados ao Santos de Pelé, ao Flamengo de Zico, ao Palmeiras da Parmalat ou mesmo ao São Paulo do “bi-mundial?”

O São Paulo atual conta com jogadores improvisados que, face a carência de qualidade no certame nacional conseguem demonstrar uma inegável superioridade.

Ainda demonstrando que o futebol atual não é como o de outrora, deixou outra pergunta aos amigos: “qual jogador em atividade entraria no time de todos os tempos da agremiação que defende?”

Talvez apenas o Rogério Ceni no São Paulo seja lembrado. Nas demais agremiações, nenhum jogador em atividade seria, responsavelmente lembrado por algum torcedor.

E aqui vem a esperança. O Corinthians enfrentou o Santos na última rodada. Uma simples análise diz que o elenco do Santos é muito mais gabaritado e tem, ainda, o comando de um dos melhores técnicos brasileiros de todos os tempos. Mas, a contrário do previsto, com empenho, dedicação defensiva incondicional e inteligência quando de posse da bola, o Corinthians, comandado por um interino, superou a equipe da baixada santista num jogo perfeito onde cada atleta fez exatamente aquilo que deveria fazer, tendo jogado para o time e não para si.

Cada um sabe o que tem que fazer, seja no futebol, na sua profissão, na vida privada, e, quando apenas à isso se limita a atuação, o resultado é a obtenção da meta.

Acima comentei que bons profissionais padecem num meio poluído, contaminado, mas, com zelo, afinco e total entrega, quando os objetivos são recorrentemente buscados, os mesmos são atingidos.

A falta de qualidade no futebol nacional pode ser apenas uma fase, desde que, coerentemente sejam buscadas alternativas para que sejam, descobertos e mantidos aqui os novos talentos.

A organização e a atuação de forma clara e transparente pelas entidades ligadas ao esporte, federações e agremiações, acarretarão, fatalmente, no interesse de patrocinadores que, certamente, investirão no esporte e, os clubes, com esse capital, poderão investir responsavelmente nas categorias de base. Então, com transparência, serão efetuados contratos sem a utilização de artimanhas para menor recolhimento impositivo, motivo de muitos “rompimentos” de vínculo.

Obviamente que as medidas aqui elencadas não servirão para que consigamos manter aqui grandes astros do futebol internacional, mas poderão contribuir para que o campeonato brasileiro não perca craques e “potenciais” para mercados menos importante como o futebol do leste europeu, futebol árabe, coreano, japonês, etc...

Atuando os dirigentes apenas para representar suas respectivas agremiações, sem conflitos de interesses; os empresários visando o lucro decente, obtido na prestação de um serviço e não de mero agenciamento de atletas, teremos um meio menos comprometido, até porque, assim, não haverá quem tenha coragem, publicamente, de elogiar, por interesse, jogador que nada faz em campo.

Assim, cada um fazendo sua parte, como os garotos do Corinthians fizeram na rodada passada, poderemos ter a esperança de um futebol não apenas de melhor qualidade nas quatro linhas, mas também mais digno, de acordo com a tradição do futebol brasileiro.

Não sou corintiano, longe disso, mas essa é a prova de que no futebol, são "onze contra onze"; digo mais, a prova de que, quando as pessoas se dispõe a uma meta e, com afinco, entrega, dedicação, lutam por aquilo, o resultado positivo é inevitável.

Não entendo, portanto, como, identificados os problemas no nosso futebol, tardamos em corrigi-los, assim como não entendo que jogadores ditos “profissionais”, não atuem com dedicação na sua profissão.

Este “momento” infeliz não se limita apenas ao futebol nacional; o brasileiro está descrente com vários institutos... com a política, com a sociedade, e, como disse, com o próprio esporte bretão.

É hora de profissionalismo dentro e fora de campo. Hora de que façamos exatamente aquilo que sabemos, devemos fazer.